quarta-feira, 3 de março de 2010

Exames complementares "simples" são preteridos nas clínicas


Antônio Marinho


Médicos abusam de tomografias e irradiam pessoas sem necessidade.

Descoberto há pouco mais de cem anos, o exame de raios X ainda é um excelente meio de diagnóstico. Porém, está com os dias contados, assim como o ultrassom, bem mais novo. O motivo é que clínicas não querem fazer esses procedimentos, pelo qual recebem de R$ 15 a R$ 45. Quem tenta marcar um desses exames espera pelo menos 45 dias, quando consegue.


Faltam máquinas e profissionais qualificados para operá-las. Resultado: um número cada vez maior de crianças e adultos submetidos a exames mais caros e expostos a mais radiação sem necessidade. Uma tomografia equivale a 400 radiografias de tórax, o que eleva o risco de câncer, já que o seu efeito no corpo é cumulativo.


O problema é tão grave que o Colégio Brasileiro de Radiologia e Diagnóstico por Imagem (CBR) participa da campanha educativa "Image gently" (www.imagegently.org), de alerta ao abuso de exames radiológicos, principalmente tomografias. Ela foi criada pela Aliança para Segurança Radiológica em Imagem Pediátrica e o principal alvo são as crianças. E não é só no Brasil que há preocupação.


Os Institutos Nacionais de Saúde dos Estados Unidos (NIH, em inglês) querem que os fabricantes de tomógrafos e outros aparelhos que produzem radiação façam o rastreamento das doses aplicadas e que esses dados entrem no prontuário eletrônico dos pacientes. Isso porque novos estudos sugerem que a repetida exposição à radiação em exames aumenta a chance de tumores. A medida inclusive foi publicada na revista do "Colégio Americano de Radiologia".


Autoridades americanas cobram maior segurança Para aumentar a segurança, fabricantes estão instalando dispositivos que avisam ao operador quando o nível de radiação ultrapassa o indicado.


Ano passado, hospitais da Califórnia relataram mais de cem casos de sobredose aguda de radiação em tomógrafos.


E muitos desses pacientes perderam cabelos e sofreram enrijecimento da pele.


Na opinião de radiologistas brasileiros, apesar de não haver certeza de que a radiação emitida em radiografias cause câncer, o risco existe, mesmo em baixas doses.


- Em muitas situações, o exame de raios X é útil e dispensa a tomografia, como, por exemplo, sinusite e doenças articulares. Mas há casos em que o médico ou a clínica recebe R$ 5 por esse procedimento, e o valor não compensa custos com manutenção e pessoal. Daí a opção por tomografias, que pagam mais e podem ser feitas em poucos minutos - diz o radiologista Sebastião Cezar Mendes Tramontin, presidente do CBR.


Uma medida para evitar essa situação, diz Tramontin, seria a melhor remuneração para métodos como raios X e ultrassom (este, como a ressonância, não usa radiação). O CBR reforça que exame de imagem deve ser pedido apenas quando há benefício médico claro, e deve ser indicado para investigar apenas a área de interesse.


- É difícil encontrar técnicos e médicos, principalmente entre os jovens, bem treinados e capacitados em raios X e ultrassom; este um exame demorado e que depende muito do médico. Alguns fazem cursos de 15 dias e se acham capacitados para dar um laudo. O CBR ofereceu residência de longo período nessa área e não houve interessado - diz o radiologista Romeu Cortês Domingues, diretor científico do CBR e da Clínica de Diagnóstico por Imagem (CDPI).


Mau uso de aparelhos piora o problema Romeu afirma que nenhum médico quer receber R$ 9 por exame de ultrassom, no qual gasta pelo menos 20 minutos: - Estamos irradiando pacientes desnecessariamente, inclusive crianças. Nos Estados Unidos, cientistas acreditam que 2% dos casos de câncer estão relacionados ao acúmulo de radiação por exames de imagem - acrescenta o radiologista.


- É preciso criar diretrizes e aplicar melhor os recursos e equipamentos em radiologia. Um exame de apendicite na mão de um médico bem treinado pode ser feito com ultrassom, sem necessidade de tomografia.


Além de máquinas ruins e mau usadas (40% dos mamógrafos da rede pública estão quebrados, ou ainda encaixotados, segundo a Sociedade.


Fonte: O Globo

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